segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Guiné Bissau: A entrevista que vale duas buzinadelas


Só hoje vi, e ouvi a entrevista/encomenda feita ao 'presidente de transição' da Guiné-Bissau, Serifo Nhamadjo, e que passou ontem no programa 'Sociedade das Nações' na Sic Notícias. Para poupar atalhos, devo desde já dizer que essa entrevista não tem ponta por onde se lhe pegar. Foi um Serifo Nhamadjo bastante nervoso aquele a quem meteram um microfone à frente para debitar postas de pescada.

Acho que Serifo Nhamadjo perdeu uma boa oportunidade para pedir solenemente desculpas ao povo da Guiné-Bissau e admitir a sua quota parte de responsabilidade no golpe de Estado de 12 de Abril, e a interrupção, de forma violenta, do processo eleitoral que estava em curso e que culminou com a implantação de uma ditadura militar feroz, que vive da perseguição, do rapto, de espancamentos e de assassinatos de cidadãos guineenses - a quem o Estado devia garantir protecção e segurança, como diz a nossa Constituição.

Acho que Serifo Nhamadjo devia igualmente ter pedido desculpas a Portugal, e a Angola. A Portugal, pela acusação irreflectida e irresponsável, de conivência com Pansau Ntchama na 'tentativa' do assalto ao quartel dos para-comandos e que teve um saldo trágico: dezenas de guineenses foram chacinados! Outra desculpa a Portugal, pela desavergonhada encenação que foi a 'operação' de 'captura' do Pansau Ntchama, pateticamente encenada e em que este aparece envolto numa bandeira deste país nosso amigo, maior contribuinte líquido e o principal parceiro bilateral da Guiné-Bissau - como se Portugal tivesse alguma coisa a ver com o assunto. Lá está, Serifo não fez o trabalho de casa. Em vez de dar a mão à palmatória, decidiu afundar um pouco mais a Guiné-Bissau. E um pouco mais é... muito mau.

Acho que Serifo Nhamadjo deve igualmente um pedido de desculpa a Angola, por ter contribuido decisivamente para a interrupção abrupta e à base de calúnias, da brilhante reforma nos sectores da Defesa e da Segurança (em que a própria União Europeia queimou dezenas de milhões de euros dos seus contribuintes e depois admitiu que fora "um fiasco"...) que Angola, um país nosso irmão estava a levar a cabo. Preferiu a má-língua: que "Angola tinha mais material bélico que as nossas forças armadas", disse-o com todas as letras - 53 letras, para ser preciso. Mas não disse que era Angola que alimentava as forças armadas da Guiné-Bissau, que era Angola que estava a construir e a reconstruir todos os quartéis da Guiné-Bissau (para que os quartéis passassem a ter água canalizada, telhados, tudo em condições); não disse o 'presidente de transição', que o dinheiro de Angola serviu para formar perto de 700 homens e mulheres para a polícia e para a Guarda Nacional, que o dinheiro de Angola serviu para encher o bandulho a muita gentalha. Assim, a entrevista do 'presidente de transição'... Esta entrevista vale duas buzinadelas: uma para o entrevistado, outra para o entrevistador...

Serifo Nhamadjo aparece sem rede. Não tem atrás (no 'seu' gabinete de trabalho) uma bandeira da Guiné-Bissau. E, desconfortável, disparava contra os mesmos alvos: Angola e, voilá!, Portugal. Que Portugal apoiou a guerra civil (que TODO o povo guineense apoiou, como TODO o povo guineense condenou o golpe de 12 de abril). "Há muita desinformação, até disseram que eu dormia com o CEMGFA António Indjai na Presidência". Veja só, senhor jornalista! Antes isso, sr. 'presidente de transição'. Antes isso. Fazem um belo par, não haja dúvidas.

Que Serifo Nhamadjo não se preparou para a entrevista, isso foi por demais evidente; agora que o jornalista estivesse à altura do entrevistado... isso é imperdoável. Estou à espera para ouvir, se é que também houve, a entrevista com o porta-voz do Estado-Maior General das Forças Armadas, perdão, do António Indjai, aliás, do 'governo de transição'...

Convido-vos, e ao 'presidente de transição', a ouvirem como deve falar um Chefe de Estado...


FONTE: Ditadura do Consenso ( António Aly Silva )

Um comentário:

  1. Foi uma daquelas entrevistas que os regimes pretendem dar; não das que são pedidas por determinado órgão de informação. Foi uma forma de tentar dar credibilidade a um Chefe de Estado não eleito.

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